terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Vamos falar a verdade

Então, tá. Chega de enrolar. A verdade é que eu não sou tudo isso. Não, muitas das coisas que sou - que até eu acredito que sou - são pura maquiagem. Eu fico tentando dar fôlego a coisas datadas. Crio situações. Eu me dou mal e não admito. As pessoas me magoam, às vezes com razão, e eu fico tentando achar razões minhas para tirar a razão delas. Enxergo o que eu queria ver onde ele não existe. Muitas vezes desprezo o que está na minha cara, mas não é bonito de ver, por covardia, desamor ou puro e tolo orgulho.

Eu canto sozinha e tenho vergonha de fazê-lo na frente dos outros. Eu tenho medo de perder o script ou de tropeçar na rua. Eu não cumprimento pessoas que até conheço, mas com quem não teria o que conversar, ou então que não me lembram boas coisas.

Eu fico mal humorada quando estou doente ou com fome. Eu julgo. Eu tento dar pinta de saber mais do que eu sei, às vezes, pra impressionar. Eu me culpo. Eu não tenho paciência com pessoas com fé na humanidade em tempo integral. Eu não consigo mais ver o Big Brother. Eu acho Clarice Lispector maníaca-depressiva e o Renato Russo um deprimido egocêntrico. Mas eu já li Clarice Lispector e tenho dois CDs do Renato Russo, que ainda ouço de vez em quando.

Eu não gosto de salada e não me esforço por gostar. Eu acho que o fato de gostar de ler e saber escrever é grande coisa. Eu não durmo cedo, e acordo tarde em dias de folga. Eu me faço de vítima. Eu viro a cara em dias ruins, ou se estou apressada, quando alguém me aborda na rua. Às vezes eu não tenho piedade. Às vezes eu me irrito com a cega e otimista piedade alheia.

Eu me apoio egocentricamente nas pessoas. Eu esqueço de perguntar como vai a família. Eu sou preguiçosa pra fazer faxina.

É assim. Eu é vil e errônea, já diria Fernando Pessoa.

(30.01.2007)

quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

Pra não dizer que não falei de flores

Tenho em minha casa dois vasos de violetas. Chegaram em casa bonitos, como fotos de floricultura, cheios de botões e de cores. Durante umas duas estações, me brindaram com alegres tons de rosa e lilás sobre a mesa da sala. Depois disso, nada mais.

Vitaminas, terra nova, água, ar fresco não adiantavam. Com o tempo, fui me acostumando ao verde tímido das folhas e não mais esperei por floradas. Elas, as plantas, pareciam ter se conformado também, e a vida seguiu.

Vieram novos móveis. Vieram e se foram empregos, surpresas, planos, viagens e amigos. Vieram dois inquilinos à minha casa, que de morada solitária se transformou em nova modalidade de república, mais ou menos familiar. Atualizamos, reformulamos, guardamos, crescemos.

Um dia, uma nova hóspede verde obrigou a mudanças domésticas. Crescendo mais do que o esperado, requereu espaço próprio, janela própria e sol próprio. E no embalo, decidi também presentear as velhas moradoras vegetais da casa com um pouco mais de sol, de falas cúmplices e de nova terra.

Vi minha sala ser palco de uma revolução vegetal. Crescendo centímetros e centímetros a olhos vistos, a planta caloura chamou renovadas energias elementais ao ambiente. Suas colegas se juntaram ao coro. De repente, vi as antigas e tímidas folhinhas verdes, já anêmicas, se vestirem de um verde-musgo vigoroso. Todas as manhãs, elas se esticam para capturar aquele sol que não viam há anos. Voltaram ao viço da juventude.

E há alguns dias, a novidade: percebo, por entre as folhinhas, pequenos botões, inéditos há mais de cinco anos. Surpreendida, me esforço para me lembrar de que cor seriam aquelas flores ausentes há tanto tempo. Agora, dias depois, já vejo despontarem o rosa e o lilás de outrora. Em breve, acredito, acompanhados de (essas, sim) inéditas flores da nova inquilina, que provocou a revolução inicial. Estou curiosa para saber de que cor serão essas flores da boa fortuna, que acompanharão as minhas já experientes, e agora ainda mais belas, violetas.

E aprendo, mais uma vez, que não se pode, nunca, virar as costas ao sol. Peço desculpas às minhas antes anêmicas plantinhas, que souberam esperar o lampejo de consciência, já envergonhado, desta senhoria. E percebo que mesmo um começo de ano como este, conturbado para tantos, pode trazer gotas de poesia. Minha sala, banhada de sol, está inundada delas. :)

PS - Outra lição a tirar do episódio: sempre ouça - e agradeça - os conselhos de um especialista (no caso, Mariana, namorada de meu irmão e estudante de biologia, que sugeriu que, ao contrário do senso comum, um pouco de sol faz, sim, muito bem a violetas). :)

(18.01.2007)

segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

Por um desvario

Se eu fosse fazer um pedido desvairado, leve e alegre, ia pedir para voar invisível até você, e aterrisar ao seu lado bem na hora em que uma graça te surpreendesse quieto, lendo ou ouvindo uma história, e seu rosto explodisse num sorriso inesperado e maroto. Aquele sorriso que me hipnotizou no primeiro segundo e que, pairando no ar da lembrança, me fez dormir uma noite bem-dormida em meio a tantas e até insuspeitas inquietações. Um sorriso que me persegue até hoje, que vem ao meu auxílio em momento de transtorno como o de agora, quando de repente a realidade bate na cara da gente e provoca falta de apetite, engulhos, enjôos. Nessa hora (e em outras mais felizes também) minha mente teimosa inventa de voar até você, e lembrar de novo do seu rosto se iluminando naquele sorriso maroto.

Queria ouvir de novo sua voz em contexto novo e inesperado, me trazendo a sensação de ter encontrado um tesouro num livro de histórias. Queria de novo andar pelas ruas te ouvindo rir do meu jeito de falar enquanto dirige, me olhando de vez em quando com a doçura e paciência de um velho conhecido. Queria de novo mirar a luz da tarde na parede do quarto, sozinha num dia claro, me sentindo tão estranhamente em casa como um náufrago que pressente velhas memórias invadirem sua mente, sem nome, sem cor, mas doídas de tão ternas, tão loucamente familiares.

Queria andar de novo por aquelas calçadas cheias de borboletas, entrar num bar e ter taquicardia ao ver a surpresa se avizinhando. Mas não estou lá, não estou aí, e isso faz, estranhamente, tudo mais belo. É o instante que passou, que se tornou eterno para que, em tardes cinzas como a de hoje, depois de olhos vermelhos e explosões de inquietação ao meu redor, eu possa me calar e me transportar de novo para esse lugar onde sua imagem se mistura a toda a paisagem como uma onda, como um presságio. Sei que no fundo é meu pensamento que voa, refazendo uma memória louca que não tive - mas que vem ao meu encontro sorrateira e independente de qualquer desejo meu. Como uma teimosia que encontra acolhida, como uma visão antes de acordar.

Por hora, isso é tudo. Por hora, é tudo de que preciso. E a paz, de novo, invade meu coração.

(08.01.2007)

quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

Tamos aí


Ok, vamos lá então. Vamos começar a bagaça. Meio aos trancos e barrancos, é verdade, mas melhor do que muitos outros começos. Tenho coisas boas pra comemorar. A certeza de que, como disse a amiga Fê, eu me basto, basto para meus sonhos e, por conseguinte, estou - espero - muito mais capacitada para fazer os outros felizes também. A certeza de que tenho pessoas especialíssimas ao meu lado, que o destino me trouxe, pra trilhar muitos e novos caminhos. Ternuras antigas que me dizem, sempre e apesar de tudo, que o mundo vale a pena e que é uma bênção viver. E mesmo sabendo que no fundo, esse negócio de Ano-novo é, como diria Drummond, uma invenção genial para dividir nosso cansaço e esperança em fatias, é bom aproveitar a troca de calendários, agendas e datas nas folhas de cheque. Que a nova papelaria (sempre adorei papelaria!) nos inspire a renovar também a tela da mente. Focalizemos, então, nossos olhos para os velhos problemas e pensemos em novas soluções.

Refugio-me de possíveis ressacas em uma canção de outros tempos, que faz emergirem sonhos teimosos e acordes sempre mágicos para mim. Bom Ano a todos. E que, ao invés de termos boas surpresas, possamos ter o orgulho de dizer que fomos atrás de cada uma delas, buscando-as com vontade e amor.

Feliz Ano Novo!

Ring out the old
Bring in the new

A midnight wish

To share with you

Your lips are warm

My head is light

Were we in love

Before tonight?


I don't need a crowded ballroom

Everything I want is here

If you're with me

Next year will be

The perfect year


No need to hear
The music play
Your eyes say all
There is to say
The stars can fade
And they can shine
Long as your face
Is next to mine

It's new year's eve
And hopes are high
Dance one year in
Kiss one goodbye
Another chance,
Another start
So many dreams
To tease the heart

We don't need a crowded ballroom
Everything we need is here
So face to face
We shall embrace
The perfect year

(04.01.2007)