Se eu fosse fazer um pedido desvairado, leve e alegre, ia pedir para voar invisível até você, e aterrisar ao seu lado bem na hora em que uma graça te surpreendesse quieto, lendo ou ouvindo uma história, e seu rosto explodisse num sorriso inesperado e maroto. Aquele sorriso que me hipnotizou no primeiro segundo e que, pairando no ar da lembrança, me fez dormir uma noite bem-dormida em meio a tantas e até insuspeitas inquietações. Um sorriso que me persegue até hoje, que vem ao meu auxílio em momento de transtorno como o de agora, quando de repente a realidade bate na cara da gente e provoca falta de apetite, engulhos, enjôos. Nessa hora (e em outras mais felizes também) minha mente teimosa inventa de voar até você, e lembrar de novo do seu rosto se iluminando naquele sorriso maroto.
Queria ouvir de novo sua voz em contexto novo e inesperado, me trazendo a sensação de ter encontrado um tesouro num livro de histórias. Queria de novo andar pelas ruas te ouvindo rir do meu jeito de falar enquanto dirige, me olhando de vez em quando com a doçura e paciência de um velho conhecido. Queria de novo mirar a luz da tarde na parede do quarto, sozinha num dia claro, me sentindo tão estranhamente em casa como um náufrago que pressente velhas memórias invadirem sua mente, sem nome, sem cor, mas doídas de tão ternas, tão loucamente familiares.
Queria andar de novo por aquelas calçadas cheias de borboletas, entrar num bar e ter taquicardia ao ver a surpresa se avizinhando. Mas não estou lá, não estou aí, e isso faz, estranhamente, tudo mais belo. É o instante que passou, que se tornou eterno para que, em tardes cinzas como a de hoje, depois de olhos vermelhos e explosões de inquietação ao meu redor, eu possa me calar e me transportar de novo para esse lugar onde sua imagem se mistura a toda a paisagem como uma onda, como um presságio. Sei que no fundo é meu pensamento que voa, refazendo uma memória louca que não tive - mas que vem ao meu encontro sorrateira e independente de qualquer desejo meu. Como uma teimosia que encontra acolhida, como uma visão antes de acordar.
Por hora, isso é tudo. Por hora, é tudo de que preciso. E a paz, de novo, invade meu coração.
(08.01.2007)
segunda-feira, 8 de janeiro de 2007
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